quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Eu topo!


Eu topo.
- Maria (Lucas 1:38)

E aí que tem essa garotinha judia, provavelmente de 13 ou 14 anos, e de acordo com o evangelho de Lucas, um anjo de Deus aparece a ela e diz que ela encontrou graça diante de Deus. E que ela ficará grávida, e que o seu filho será o Filho do Altíssimo, e ele terá o trono do seu Pai Davi. E o reino dele não terá fim.
Maria, porém, tem algumas perguntinhas básicas a fazer:
Mas, como? Eu nem tive relações sexuais ainda.
O anjo responde:
O Espírito Santo virá sobre ti e a força do Altíssimo te encobrirá.
Esta menina Maria ouve tudo que o anjo tem a dizer e, em seguida, responde:
Eu sou serva do Senhor, que aconteça comigo conforme a tua palavra.
Ou como diríamos: Eu topo!
Bom, um pouco sobre de onde Maria vem. Ela é parte de uma tribo que diz ter sido escolhida pelo único Deus verdadeiro. Isto era incomum porque as outras tribos tinham muitos deuses. Um antigo escritor disse que era mais fácil encontrar deuses do que homens em Atenas. Deuses em todos lugares. Mas essa tribo crê que existe um único Deus acima de todos eles, um Deus tão grande, tão além, que eles foram proibidos de sequer fazer estátuas desse Deus.
Essa era uma ideia nova. Até um pouco estranha.
Mas essa tribo agarrou-se firmemente à convicção de que o seu Deus era puro Espírito, incapaz de ser remotamente representado por qualquer imagem que um ser humano poderia criar. Em uma reviravolta fascinante, eles acreditavam que ao invés de pessoas criando deuses à sua imagem, Deus criou as pessoas de acordo com a imagem dele próprio.
O que soa agradável. Mas essa tribo, em particular, havia sido conquistada de novo, e de novo, e de novo. Egípcios, babilônicos, assírios, selêucidas. Uma superpotência atrás de outra, cada uma delas teve a oportunidade de fazer da vida dessa tribo, miserável.
O que provavelmente deve ter levantado uma pergunta em Maria: Se o nosso Deus é o Deus acima de todos os outros, a nossa terra é a terra santa, e nós somos o seu povo, então como é que continuamos levando porrada?
A história repetia-se, opressão atrás de opressão, um império dominante seguido de outro. Até os dias de Maria, em que o império dominante se chamava Roma. Eles zombavam da tribo de Maria. Construíram as suas sedes militares mais altas do que o templo de Deus só de pirraça. Os romanos eram governados por uma série de imperadores chamados de César.
Acreditava-se que eles eram os filhos de Deus, e que Deus os enviou para trazer um reino universal de paz e prosperidade.
Eles tinham um slogan popular: Não há outro nome abaixo dos céus pelo qual podemos ser salvos, a não ser César.
Eles exigiam que todos reconhecessem que César era o senhor.
E assim, eles marcharam por todo mundo conhecido, conquistando terras, e exigindo que as pessoas reconhecessem César como senhor. Extraindo impostos esmagadores das pessoas para financiar exércitos maiores.
Caso você achasse ruim, tinha uma tecnologia chamada estaca de execução em que você seria executado em demonstração ao que acontece quando se resiste a César.
Era como eles faziam paz. Submeter-se, ou ser crucificado.
Era o mundo que Maria viveu. César no trono. O poderoso opressor no comando. A dominação implacável.
Você pode imaginar a vergonha? Porque é isso que o povo de Maria vivia. Cansado de ser pisado, cansado de ser chutado. Cansado de adorar um Deus que permite que pessoas que nem sequer reconhecem o Senhor verdadeiro vençam repetidas vezes.
Então, quando o anjo lhe dá esta notícia sobre um bebê que vai governar um reino, ela responde emocionada com um poema épico chamado Magnificat.
Ela diz que Deus tem estado consciente do estado humilde da sua serva. E que a misericórdia de Deus se estende àqueles que o temem. Ela diz que Deus tem derrubado governantes dos seus tronos (tem mesmo?).
Ela continua louvando a misericórdia do Senhor. Dizendo que Deus tem cumprido o que ele prometeu aos seus antepassados.
Para a audiência de Lucas, o contraste deve ter sido impressionante. Quem é essa adolescente, filha de Abrãao, para dizer que seu bebê vai durar mais que César?
Maria. César.
Uma adolescente. O governante do mundo.
Maria comemorando porque César vai cair.
Você pode ver as sementes revolucionárias da história de Jesus?
É politicamente subversivo, desafiante e louco. E olha que Jesus nem tinha nascido ainda.
Lucas está contando uma nova história. Uma história sobre um caminho além de César. Ele está oferecendo ao mundo a notícia revolucionária de um novo Senhor. Aquele que não vai mudar o mundo através da violência militar, mas de um amor sacrificial.
Qual é o melhor caminho? Poder opressivo ou amor?
Quem é o Senhor, César ou Jesus?
Essa é a pergunta que Lucas está fazendo, e ele começa isso tudo com essa garotinha que está pronta para colocar a mão no fogo por tudo que Deus tiver em mente.
É por isso que a história de Jesus parece perder o seu poder gritante quando nós a tiramos do contexto e colocamos a nossa sociedade mainstream como referencial. Ela diz respeito a um povo oprimido.
Ela é um lembrete atemporal de que a força coercitiva é tênue, na melhor das hipóteses. Os impérios são frágeis. Os políticos, os imperadores, os magnatas, os líderes, as grandes tropas, vem e vão como o vento. Porque todos eles, no fim das contas, fazem parte de um regime temporário.
Deus não se esqueceu. César está para cair.
O grito dos oprimidos foi ouvido e um bebê está prestes a nascer.
E tudo isso começa com uma adolescente que diz: Eu topo.
Essa criança está para nascer.
“Eis o grande Rei que nos libertará da tirania de Roma”?
Não. Lembre-se, essa história nada tem a ver com o estabelecimento de um regime temporário, mas de um reino eterno.
“Eis o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”.
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sábado, 12 de dezembro de 2015

Ele está à frente


“Mais uma vez, irou-se o Senhor contra Israel. E incitou Davi contra o povo, levando-o a fazer um censo de Israel e de Judá. ” 2 Samuel 24

“Satanás se levantou contra Israel e incitou Davi a fazer o censo. ‘’ 1 Crônicas 21

Qual é? Deus incitou Davi a fazer o censo, ou foi satanás?
A Bíblia diz uma coisa e depois diz outra completamente diferente.
O que fazemos com uma contradição dessas? Várias coisas.
Primeiro, um pouco sobre porque o censo pode ser um problema. Quando você faz um censo, é porque quer saber quantas pessoas tem, certo? E por que você quer saber isso? Porque isso lhe diz o quão grande você pode construir o seu exército. Diz com quem você pode e com quem você não pode guerrear. De maneira prática, você descobre o quão grande você pode construir seu império.
E por que isso pode ser um problema? Porque essas pessoas são chamadas para serem diferentes. Elas fazem parte de uma sociedade contrária às outras. Elas fazem parte de uma tribo que vive na aliança fiel com o seu Deus, o qual insiste em dizer que pode protege-las e guiá-las. Fazer o censo é uma falta de confiança.
Em segundo lugar, a parte da contradição.
2 Samuel foi escrito por volta de 600-500 a.C.
1 Crônicas foi escrito por volta de 400-250 a.C.
Assim, 2 Samuel foi escrito antes. Algumas centenas de anos antes.
A história contada antes diz que foi Deus que o incitou a fazer, a contada depois diz que foi satanás.
Por que isso é tão interessante?
Porque quanto mais cedo nós estamos na História, mais veremos as pessoas atribuindo todo tipo de raiva e violência aos seus deuses. Era assim que as pessoas concebiam os deuses. Eles acreditam que eles eram vingativos e era necessário oferecer sacrifícios para aplacar a ira. Você pode ler mais sobre isso aqui.
E como explicar esses relatos conflitantes?
Com o tempo, as pessoas evoluíram em suas concepções de Deus. Elas perceberam que um Deus bom não incitaria alguém a fazer algo ruim. Então deveria haver alguma outra força o incitando.
E aí é que a ideia de satanás entra.
Mas o que aconteceu no Jardim do Éden?
Nesse relato não se fala claramente de satanás, mas de uma cobra falante. Era simplesmente muito abstrato ainda.
Então qual é a primeira vez que a palavra “satanás” aparece na Bíblia?
Aqui em 1 Crônicas 21. E Crônicas não foi escrito até o exílio, bem mais tarde na história de Israel. A ideia de satanás não emerge até o fim do Antigo Testamento. Não surgiu até o exílio, época em que os hebreus haviam experimentado tamanha opressão e sofrimento, distantes de casa e em meio a uma grande alienação.
Eles se deram conta de que esse Deus dúbio era impossível.
Portanto, não há uma contradição, mas sim uma evolução. Uma sofisticação da concepção da natureza de Deus e do mal. Eles estão aprendendo sobre um novo tipo de Deus.
Não é exatamente isso que acontece em toda Bíblia?
Por exemplo, o livro de Levítico. É um livro revolucionário.
Você deve estar se perguntando: Como essa louca consegue colocar Levítico e revolucionário na mesma frase?
Pois é, acabei de fazer.
É um livro que começa com extensas (para ser honesta: chatas) instruções sobre como oferecer sacrifícios. A oferta de cereais, a de paz, a pelo pecado, e a pela culpa.
Para piorar, versos após versos do que fazer com a gordura, os lombos, o fígado, o sangue do animal.
Mas, calmaí. Primeiro, o livro começa com o Senhor (e este nome para Deus está interligado a um Deus que os livra de tudo em que eles estão subjugados) dizendo a Moisés para dizer ao povo:
Quando você traz uma oferta ao Senhor...
A palavra oferta aqui é a palavra hebraica Corban, que significa “se aproximar”.
Aproximar-se.
Os deuses naquela época eram tidos como distantes, individuais, exigentes, impessoais e em constante necessidade de serem apaziguados.
Mas, tipo, desse Deus você pode se aproximar?
As pessoas não falam de deuses como esse. Elas não concebem esse tipo de Deus.
Esse Deus é diferente. Você pode se relacionar com Ele. Você pode se aproximar dele.
E uma das ofertas é chamada oferta de paz. É uma oferta que você dá porque tem paz com Deus. E uma das instruções do capítulo 7 é que a carne oferecida deve ser comida, no mesmo dia.
Como se chama isso? Refeição.
Você chegará a esse Deus e então você terá uma refeição celebrando a paz que tem com Ele.
Em outras palavras, você pode saber onde está esse Deus. Mas e se você fez uma coisa de errado? Há uma oferta para isso. E se você se sente culpado? Há uma oferta para isso.
Sim, sim, claro, pessoa moderna. Talvez pareça um pouco primitivo. Foi há muito tempo.
Vamos direto ao mundo moderno: Por que eles simplesmente não ignoram todos esses sacrifícios?
Isso teria sido incrível. Não era o que Deus queria? Anunciar que o sacrifício final já havia sido feito, declarar que o templo será demolido. Olha só, já estamos mais à frente, né?
Mas como se muda uma consciência inteira formada por séculos e séculos? Como mudar todo um sistema? Você simplesmente destrói tudo de uma vez ou adentra na cultura deles, na língua deles, no convívio deles, na forma de pensar deles, e vai gradualmente introduzindo novas ideias, fazendo mudanças passo a passo?
Então, Levítico é um passo. Um passo revolucionário para uma concepção do divino.
E é isso que Paulo quis mostrar quando disse que a lei era um tutor. É necessário para uma temporada. Mas em seguida, você evolui. Você se adapta e ganha maturidade. Descobre que algumas coisas já não são mais necessárias.
E não é esse o caminho para a graça?
A graça é a maioridade do homem. É o nível mais alto que podemos chegar.
É o nível em que queremos estar.
É a evolução máxima. É onde Deus nos propõe estar desde a fundação do mundo.
É quando algumas coisas que eram tão importantes perdem a sua necessidade. É quando entendemos quem é o protagonista.
Mas para chegarmos a essa dispensação, precisamos nos desapegar de conceitos errados sobre Deus, conceitos retrógrados.
Nosso Deus está à frente. Nós já estamos à frente.
Não há mais tempo de nos deixarmos levar por deuses primitivos.
Graça é maturidade. E poucos desfrutam dela.

“Deus é um comediante a atuar para uma plateia assustada demais para rir.’’ (Voltaire)
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sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Luz - Trevas - Luz



Um homem descia de Jerusalém para Jericó, quando caiu nas mãos de assaltantes. Estes lhe tiraram as roupas, espancaram-no e se foram, deixando-o quase morto.
Aconteceu estar descendo pela mesma estrada um sacerdote. Quando viu o homem, passou pelo outro lado.
E assim também um levita, quando chegou ao lugar e o viu, passou pelo outro lado.
Mas um samaritano, estando de viagem, chegou onde se encontrava o homem e, quando o viu, teve piedade dele.
Aproximou-se, enfaixou-lhe as feridas, derramando nelas vinho e óleo. Depois colocou-o sobre o seu próprio animal, levou-o para uma hospedaria e cuidou dele.
No dia seguinte, deu dois denários ao hospedeiro e disse-lhe: ‘‘Cuide dele. Quando voltar lhe pagarei todas as despesas que você tiver’’.
(Lucas 10:30-35)

Bom, tem muita coisa aqui, vamos por partes. Eu escrevi recentemente um texto sobre essa parábola, você pode clicar aqui para ler. Nele fiz uma apanhagem geral sobre a natureza da pergunta feita pelo mestre da lei, sobre quem é o próximo. Neste, quero interpretar a parábola de forma mais profunda, com maior altitude, saindo do momento e indo de Gênesis a Apocalipse.
Tenho percebido a riqueza das parábolas de Jesus, de uma forma que jamais havia percebido antes. Elas vão da política até a vida após a morte em questão de segundos. Elas se movem de forma inconstante e até bagunçada. Esse é Jesus.
Você já parou para pensar que existe uma grande história sendo contada? Uma história que vai do jardim do Éden a um novo Céu e uma nova Terra. Ela caminha em direção a um “fim” certo. Ela começou na luz e vai terminar na luz.
E essa parábola conta a história da humanidade em poucos versos.

Um homem descia de Jerusalém a Jericó = Adão, você
Jerusalém = Éden
Jericó = Morte eterna
Assaltantes = O diabo e os seus anjos
Lhe tiraram as roupas = Despiram-no da sua imortalidade
Espancaram-no = Persuadiram-lhe ao pecado
Deixando-o quase morto = Vivendo no corpo, mas morto espiritualmente
Sacerdote e levita = Ministros da Antiga Aliança
Um bom samaritano = Jesus Cristo, desprezado e humilhado, o salvador inesperado
Enfaixou-lhe as feridas = Livrou-lhe das limitações do pecado
Óleo = A alegria da nova esperança
Vinho = Exortação para uma vida fervorosa no Espírito
Animal = O Cristo encarnado moído
Hospedaria = A igreja
No dia seguinte = Depois da ressurreição
Hospedeiro = Paulo
Dois denários = A plenitude da vida agora, e a promessa de uma vida futura

A história que está sendo contada é sobre o mundo sendo restaurado, renovado e recriado. É sobre o céu vindo à Terra de forma em que o céu e a Terra se tornem o mesmo lugar. É sobre Deus reafirmando a bondade da sua criação. Esse livro não é sobre evacuação, sobre fuga, não é sobre outro lugar. É sobre engajar esse mundo, porque é o único que temos, é o único que Deus se importa. É onde a história se desenrola.
E Deus é uma dança de amor e generosidade, que de maneira inesperada, nos alerta a respeito da nossa constante remissão. E Ele vai fazer o que for preciso, Ele vai correr em direção ao filho rebelde e dar uma festa, Ele vai deixar as 99 ovelhas em favor de uma, Ele vai deixar as 9 moedas em prol de uma, e quando achá-la, fará uma festa que vale mais que a moeda que Ele achou. Pois o que move Deus é a sua imagem, ela tem valor infinito. E Ele não deixará que a Sua imagem se perca.
E por que graça é tão simples assim? Porque graça é Deus.
São 5 versos, mas são milhares de anos. Anos de seca, anos de escuridão no meio do processo. Mas você já parou para pensar por que o poema da criação em Gênesis 1 tem como refrão “tarde e manhã”? O sábado judaico começa no pôr do sol da sexta-feira, passa pela noite, e acaba em pleno dia. Essa é a nossa jornada. Movendo-nos da escuridão para a luz. Movendo-nos do erro para a verdade. Movendo-nos da ignorância para a sabedoria. O autor está dizendo: “Acorde, venha para a luz! ” Porque essa jornada começou na luz e vai terminar na luz. 
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sexta-feira, 6 de novembro de 2015

A compaixão repugnante


“Então, Pul, rei da Assíria invadiu a terra...”
“Então Tiglate-Pileser veio e deportou as pessoas...”
“Salmanaser, rei da Assíria, marchou contra Samaria e a sitiou...”
- Trechos de 2 Reis 15 e 18
Invadidos.
Deportados.
Sitiados.
Invadir é quando você levanta um exército, marcha para outro país e o toma usando de força e violência.
Deportar é quando você captura habitantes do país que você invadiu e forçosamente os remove das suas casas, empregos, famílias, terras e, em seguida, os leva para longe.
Sitiar é quando você cerca a cidade com o seu exército e separa a cidade das suas fontes de água e comida, de forma que as pessoas fiquem famintas, com sede, sofrendo e morrendo até que elas desistam e se rendam.
Os assírios, com outras palavras, eram maus. Desagradáveis, brutais, violentos, opressivos e faziam a vida dos israelitas miserável. Ano após ano.
É justamente durante essa época da história que surge um homem chamado Jonas. Jonas era uma israelita. E, de acordo com essa história, o Deus de Jonas o manda à grande cidade de Nínive para pregar àquele povo.
E Nínive ficava na... Assíria.
Assíria? Nosso pior inimigo? Esses monstros que fizeram da vida do nosso povo um inferno tantas vezes? Você quer que eu vá para a cidade da besta e faça algo bom para eles? Cada uma.
Jonas não quer nem saber e se dirige ao porto mais próximo, salta em um navio, e vai para a direção exatamente oposta a Nínive.
Claro que ele faz isso.
Você faria também.
Bom, essa história é contada focando na desobediência de Jonas na primeira parte e na segunda parte acaba com a seguinte lição de moral: “Viu o que acontece quando não fazemos o que Deus manda?”
Mas como você imagina que os israelitas ao ouvirem isso reagiram? Eles odiavam os assírios. Será que eles enfatizaram a obediência ou aplaudiram Jonas?
Então, ele fica no barco, uma tempestade vem, e rola uma discussão na tripulação sobre a causa da tempestade, e eles decidem que Jonas é o problema e o jogam no mar. Ele é engolido por um peixe, e lá ele ora a Deus e o peixe o vomita, o vomita em Nínive. Os ninivitas são fantasticamente receptivos à mensagem e, em seguida, a história termina com Jonas tão deprimido que ele quer se matar.
Tem tanta coisa aqui. Por onde eu começo?
Ok, vamos começar pelo ponto que você supõe que uma história de israelitas deve começar categoricamente simples, fazendo a difereça entre o bom e o mau, o certo e errado.
Mas o israelita nessa história, aquele que supostamente segue a Deus, corre na direção oposta a Deus. A palavra usada é fugir. Jonas foge. Em seguida, ele acaba em um barco de marinheiros pagãos que oram.
E enquanto eles estão orando para a tempestade parar, Jonas não ora, ele dorme.
Os marinheiros passam por um processo até descobrir qual era o problema, sendo que Jonas sabia o tempo todo que ele era o problema.
E então, quando ele finalmente chega a Nínive depois de resistir a Deus várias vezes, esses monstros dos assírios estão tão abertos para a mensagem de Deus que o rei ordena que até os animais sejam cobertos de saco.
Esses sacos eram o que você usava enquanto clamava a Deus, ciente dos seus pecados, e pedindo misericórdia. O rei ordena que todos se arrependam e vistam os sacos, incluindo os animais!
Estamos acostumados com um mundo onde vemos as coisas de forma dualista. As pessoas boas e as más, nós e eles.
Mas nessa história, as categorias são todas misturadas e bagunçadas. O israelita, supostamente justo, é, na verdade, preguiçoso e arrogante. Enquanto os pagãos perversos são completamente receptivos à mensagem de Deus para eles.
E então, depois de Jonas ver tudo que aconteceu com os ninivitas, a mudança milagrosa no coração deles, ele está tão chateado que quer morrer.
E ele diz a Deus: Eu sabia que tu eras um Deus misericordioso e compassivo, muito paciente e cheio de amor...
E então, ele acrescenta: Agora, Senhor, tira-me a vida, pois me é melhor morrer do que viver.
Mas que história bizarra.
Uma história em que nenhum personagem faz o que você espera que eles façam. O que levanta alguns questionamentos como: Por que essa história permanece? O que faz as pessoas contarem essa história, acharem relevante e preservá-la?
Em primeiro lugar, essa história é sobre um homem, mas trata-se de uma nação. Jonas não quer ir a Nínive porque os assírios tinham tratado os israelitas horrivelmente. Essa história está fazendo a pergunta:
Será que Jonas pode perdoar os assírios?
Que é: Será que Israel pode perdoar a Assíria?
Bom, a conclusão é que o seu inimigo pode ser mais aberto ao amor de Deus do que você.
E Jonas está com raiva no final. Com raiva da misericórdia, do perdão e do amor de Deus.
Porque, convenhamos, nesse caso, é bem irritante.
Mas isso nos leva a um tema maior. Israel foi chamado para ser luz do mundo, para mostrar o amor redentor de Deus ao mundo (Gn 12).
E eles estavam há anos-luz disso.
Há uma pergunta então que permanece na história de Jonas:
Você pode perdoar o seu pior inimigo e ser um canal através do qual o amor de Deus fluirá em benefício dele?
E isso é mais sobrenatural do que o grande peixe engolir Jonas, ele permanecer lá por 3 dias e ser vomitado em seu destino. Esse também não é o ponto.
É uma pergunta para Jonas, mas é uma pergunta para Israel.
É por isso que o livro não acaba com uma conclusão, ou com um julgamento, ou com uma explicação do que Jonas faz a seguir.
O livro acaba com uma pergunta que Deus tem para Jonas:
Não deveria eu ter compaixão dessa grande cidade?
É uma pergunta para Jonas, mas também para toda audiência. E o autor da pergunta sabe que eles querem responder:
Não.
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segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Altitude


Quando você lê a Bíblia, altitude é importante. Você pode ler um versículo e estudar as palavras individuais. Você pode refletir sobre uma frase. Você pode olhar para a lógica, fluxo e significado de vários versículos em uma fileira. Você pode estudar um parágrafo ou capítulo.
Ou você pode voar mais alto, olhando para todo o livro.
É isso que quero dizer com altitude: Você pode ler a bíblia de diferentes alturas. E quando você voa mais alto, você vê coisas que perderia se estivesse em voos mais baixos.
Como no livro de Atos. Como ele começa? Com Jesus dizendo aos seus discípulos que eles serão capacitados pelo Espírito para levar sua mensagem aos confins da Terra, começando com Jerusalém e depois a Judéia e Samaria. Jesus, judeu, dizendo aos seus seguidores, em sua maioria judeus, que eles vão deixar a sua pátria judaica e acabarão nos cantos mais distantes da Terra.
Pelo capítulo 8, o que vemos? Que eles ainda estão em Jerusalém! Interessante, não é? Ele diz para eles deixarem a bolha e irem a lugares mais remotos, mas 8 capítulos depois, eles ainda estão lá no mundo que sempre soube. Nós, então, lemos que uma grande perseguição irrompeu contra eles e eles foram espalhados por, espere aí, Judéia e Samaria. Fora da zona de conforto.
Agora, avancemos rapidamente para o fim do livro de Atos. Qual é a cena? O apóstolo Paulo está em Roma. Roma, para um judeu do primeiro século, era literalmente os confins da Terra.
Isso é interessante porque Jesus, antes de morrer, tinha levado seus discípulos à Cesaréia de Filipe, uma cidade dominada pelo paganismo. Os gregos criam que alguns deuses viviam debaixo da Terra, o Hades, reino dos mortos. Literalmente, “Portas do Hades”.
Eles adoravam Pan ali. Dançarinos “ninfos” dançavam danças sexualmente sugestivas para uma multidão frenética. Cabras eram trazidas para fora, e a multidão se envolvia em uma orgia (com humanos e cabras!).
Os judeus diziam que o Messias destruiria as portas do Hades, por causa do seu mal.
Os discípulos se espantaram por Jesus os ter levado para aquele lugar. E então, ele pergunta: “Quem sou eu?” E Pedro responde “Tu és o Messias, filho do Deus vivo!”
“Vivo”, em oposição aos ídolos mortos que o cercavam.
Jesus diz a Pedro que Deus o tinha revelado isso. E então afirma “Sobre essa rocha edificarei a minha igreja” OI???? Esse lugar pagão e pecaminoso??
Jesus estava dizendo que a sua igreja seria construída sobre as ruínas do paganismo, e as portas do Hades jamais prevaleceriam contra ela.
Ele estava construindo uma paixão em seus discípulos. E essa paixão deveria vencer o medo de enfrentar uma cultura hostil e mundana.
Há, então, um arco, uma trajetória, um movimento para o livro de Atos que você só vê se você voar ao mais alto, lendo o livro como uma narrativa contínua. O que você vê é que essa mensagem não pode ser contida por qualquer grupo ou etnia ou localização geográfica. A mensagem do reino de Deus simplesmente não pode ser domada.
Ela se move de Jerusalém a Roma, do conhecido para o desconhecido, do local ao global, de um grupo de pessoas para todas as pessoas.
Ela começa com um grupo específico de pessoas de uma tribo específica, mas se espalha até que esteja no centro do mundo trazendo vida para todos os tipos de pessoas de todas as origens. É uma realidade em expansão.
Você tem um cânon dentro de um cânon? Você acredita que Deus fala através de todo o texto, ou você prefere ficar com os textos aprovados que são evangelicamente domesticados?
Que não tenhamos nenhum desejo de domar o texto.
Queremos deixá-lo fora de sua gaiola e queremos vê-lo em torno de nossas vidas, devorando os nossos ossos. Não queremos ser cientistas metódicos que estudam sobre o assunto e aplicam as devidas normas, métodos e procedimentos para que possam alcançar resultados favoráveis. O impulso moderno é sempre reduzir a mensagem a princípios simplórios. A insistir continuamente que, com bastante trabalho, tudo vai fazer sentido e bola para frente, tudo se alinha depois.
Mas a vida nem sempre se alinha.
A Bíblia não é um livro limpo. Não é um guia para o comportamento adequado. Ela nem sequer parece se importar em ser "relevante" ou não.
A Bíblia é um manifesto revolucionário que poderia te matar em muitas partes do mundo. Ele está vivendo, ele está respirando. E quer que nos rendamos a ele incondicionalmente para que ele possa nos transformar.
Existe sempre algo novo para se conhecer. E uma das maiores doenças que têm infectado a igreja na era moderna é o desejo de reduzir.
O Espírito de Deus é misturado e imprevisível. E isso não é uma heresia. O Espírito se move de maneiras demasiadamente selvagens e desenfreadas e nós temos que correr para dançar no ritmo.
O lugar mais perigoso para se estar no universo é o centro da vontade de Deus.
E é onde queremos estar.
Eu espero que nós nunca pensemos que acertamos.
Eu espero que nós nunca acreditemos que chegamos.
Espero que seja sempre perigoso.
Sempre caótico.
Sempre às avessas.
Nunca resolvido.
Bagunçado.
Nós amamos as Escrituras e queremos que elas varram os nossos pés para fora.
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quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Experimente


A Bíblia no original é, humanamente falando, formada a partir da mente hebraica. Porém, em algum ponto da história eclesiástica, abandonamos o projeto inicial dentro do contexto hebraico, comum aos dias de Jesus, e substituímos por um não-hebraico, mais precisamente, greco-romano. E como resultado dessa transformação, o que foi construído a partir de então, tornou-se uma caricatura do que se pretendia.
Basicamente, o contraste entre essas duas mentalidades resume-se em: Fazer vs Saber. A hebraica está preocupada com a prática do comportamento correto. A helenística, se interessa mais na informação, e o saber tem relevância sobre o fazer. Então existe uma divergência, existe uma valorização da virtude moral, ou da virtude teórica.
Isso talvez ajude a explicar por que para algumas igrejas o foco esteja nas questões ortodoxas doutrinárias. Todos cremos nos mesmos princípios básicos, mas em pontos mínimos, divergimos e nos separamos. Demonstrando um triunfo da “doutrina correta” frente à comunhão.
Foram justamente cristãos gentios influenciados pela cultura greco-romana que sistematizaram a doutrina cristã e acabaram mudando essa doutrina de forma radical. Os hebreus nos dias de Jesus não possuíam uma teologia sistematizada a partir da qual toda doutrina tinha de ser filtrada e esquematizada.
Para muitos de nós, a mente hebraica é estranha e impossível de compreender. Por isso, começamos tentando adentrar no contexto, e não conseguimos, voltamos para o modo helenístico. Note que a maior parte do Velho Testamento foi escrita em hebraico, e o Novo Testamento em grego, mesmo assim todos os livros foram escritos por judeus que pensavam de forma hebraica, ainda que estivessem usando o grego.
Por exemplo, queremos saber quando Deus vai agir. Isso é uma visão helenística, vemos o tempo como começo, meio e fim, uma trajetória linear.  Queremos saber a ordem sequencial de quando Deus vai agir, criamos um cronograma preordenado dos acontecimentos e queremos eliminar eventos do nosso calendário a medida em que eles vão acontecendo. Essa mentalidade é alienígena para a mente hebraica, para ela, não interessa a sequência exata dos acontecimentos, o que importa é que Deus vai fazer. Isso torna a leitura do tempo cíclica, e não linear.
Na teologia ocidental também se abandona a interpretação literal em favor de uma alegórica. Isso é tipicamente greco-romano.
O grego diz que a vida é analisada em categorias precisas, o judeu diz que toda vida se mistura em todos os aspectos. O grego diz que há uma divisão clara entre natural e sobrenatural, o judeu diz que o sobrenatural afeta toda a vida. O grego diz que cada evento é um novo acontecimento e o tempo é segmentado, o judeu diz que o tempo é cíclico e eventos reaparecem constantemente. O grego diz que bens materiais medem a realização pessoal, o judeu diz que os bens materiais são bênçãos de Deus e o prazer está em compartilhar. O grego diz que a fé é cega, o judeu diz que a fé é baseada em conhecimento e experiência pessoal. O grego diz que o tempo tem pontos como em uma linha reta, o judeu diz que o tempo é analisado a partir do conteúdo (No dia em que o Senhor fez...).
Em nossa busca incessante de transformar a Bíblia em um livro de perguntas e respostas sobre Deus, acabamos distorcendo o seu conteúdo. Para a mente judaica a bondade de Deus não precisa ser analisada ou estudada, mas experimentada. Não há muita importância em falar de Sua bondade, mas a sua ênfase é posta em sua compaixão para com o homem individualmente. Em outras palavras, Deus não é conhecido no abstrato, mas em situações específicas em que Ele se afirma como Deus na vida de cada um pessoalmente.
O grego aprende a fim de compreender, o judeu aprende a fim de reverenciar e experimentar, e o homem moderno... bem, o homem moderno aprende a fim de usar. Queremos uma religião da utilidade. Queremos uma filosofia de vida. Técnicas que podem ser aplicadas conforme cada situação que passamos, “técnicas orientadas”.
O que me leva a crer que essa geração quer sim um Deus, mas quer um deus mudo, um deus que se possa colocar no fundo da gaveta, um deus que não causa transformações profundas no ser. No máximo, um deus de domingos. Essa geração ainda não percebeu que o deus que ela pensa que adora é ela mesma.
Nos dias em que o movimento de Jesus era conhecido como “seita dos nazarenos”, ser cristão estava diretamente ligado com a sua proximidade com Deus e com o próximo. Nos séculos posteriores, entretanto, demos menos importância aos relacionamentos e politizamos a fé. O antissemitismo, em seguida, destruiu a personalidade original da igreja em vários aspectos. Isso explica por que é tão difícil para nós entender a Bíblia como um todo, como uma harmonia.
Precisamos voltar às raízes da fé cristã. Precisamos de um Deus presente, de um Deus harmônico.

“Existe um caminho que vai dos olhos ao coração sem passar pelo intelecto. ” (G. K. Chesterton)
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segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Além do problema do mal


No famoso Salmo 91, existe um trecho que diz “Ainda que eu passe pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum”.
Bom, o Salmo não quer fingir que o mal e a morte não existem. Coisas terríveis acontecem também. Tanto com pessoas boas quanto com pessoas más. Mesmo em caminhos da justiça, chegaremos a vales da sombra da morte. Paulo chama isso de dia mau.  O salmista não tenta explicar o mal. Não tenta minimizar o mal. Ele simplesmente diz que não vai teme-lo. Pois de todo poder que o mal tem, ele não tem o poder de deixa-lo com medo.
Certo. Mas isso ainda constitui um problema, aparentemente. Vamos esquematizar.
- Deus é todo-poderoso.
- Deus é bom.
- Coisas terríveis acontecem.
Você consegue conciliar as duas primeiras proposições, mas não a terceira. Talvez esse seja o maior e único problema para a fé.
Você, se manjador de apologética, sabe qual vai ser minha linha de pensamento a partir daqui. Isso aí. Mas não feche a janela ainda. :P
Acontece que como a Bíblia diz, os céus são do Senhor, e a Terra, Ele deu aos filhos dos homens. Por que Deus quer um relacionamento de amor com o homem e não existe amor sem escolha. Então, Deus não criou o mal mas criou a possibilidade do mal. E isso dá equilíbrio à natureza e torna a liberdade de escolha possível. É isso mesmo, Deus está dizendo que não importa o quão feio seja o mal, o mal disfarçado de bem é bem pior. Pois embora pareça que Deus estaria sendo bom tirando a liberdade de escolha e fingindo que está tudo bem e tudo é lindo, Ele sabe que isso é um mal disfarçado de bem. E isso tornaria Deus o causador do mal. No final das contas, a sua tentativa aparentemente lógica de resolver a situação fazendo Deus tirar a liberdade, O tornaria mal de qualquer forma.
Robôs fazendo tudo ao seu bel prazer. Você adoraria se quisesse um mordomo. Mas morreria se almejasse um relacionamento. Bom, Deus definitivamente não quer um mordomo. E você, definitivamente não gostaria de ser.
Se afinal de contas, a bondade de Deus se revela em trazer todos para Si no fim desta vida, independentemente de suas próprias escolhas e vontades, Deus é um rei tirano. E eu não quero passar a eternidade com esse tipo de Deus.
Mas veja, a Bíblia não se ocupa tanto com essa questão. Embora o mal esteja presente em toda a história da humanidade, e consequentemente em histórias da bíblia, Deus não se preocupa muito em colocar os pingos nos I’s. Ele deixa muitas vezes que você subentenda a partir do Seu caráter. Tipo: Não é tão óbvio que eu sou bom????
Mas veja, vamos para uma situação prática.
Quando uma criança é estuprada, os pais não vão estar nem aí para a explicação de que Deus nos ama e por isso devemos ser livres, o que torna outra pessoa livre para estuprar a sua filha.
Isso é verdade? Sim.
Mas não é suficiente no momento de dor.
O relativismo resolve o problema do mal dizendo que ele não existe, e que é uma ilusão da mente mortal. O budismo resolve em termos de reencarnação e em uma lei inexorável de causa e efeito em que a criança estuprada está apenas colhendo as consequências de más ações que cometeu em outra vida.
O cristianismo por outro lado, não parece se preocupar demais em resolver esse problema teoricamente. Ele simplesmente aponta para o escândalo da cruz seguido da esplêndida ressurreição e diz que, em termos práticos, não há mal tão obscuro e obsceno que Deus não possa transformar em bem.
Bom, isso me lembra o primeiro capítulo de Efésios.
“Ele nos revelou o mistério da sua vontade, de acordo com o bom propósito que ele estabeleceu em Cristo, isto é, de fazer convergir em Cristo todas as coisas, celestiais ou terrenas, na dispensação da plenitude dos tempos. ” (Ef 1:9-10)
Peraí. O que? Todas as coisas? Fazer convergir todas as coisas?
Olha, “todas as coisas” nessa passagem no grego é a palavra pas, e literalmente significa... todas as coisas. Para você que já estava relativizando. 
Agora, convergir. Veja, outras versões podem dizer resumir, recolher, recontar, recapitular, trazer à tona.
A palavra é anakephalaiossathai. Vamos fazer uma pausa para apreciar o tamanho dessa palavra. Se você usa esta palavra, você não está brincando.
Ana significa novamente. Kephale significa cabeça. Anakephalaiossathai significa trazer todas as coisas a uma só cabeça.
É, Deus vai recontar a história de tudo em Cristo. Reconciliar, renovar, restaurar, pôr tudo sobre uma única cabeça.
Sua dor? Todas as coisas.
Pobreza? Todas as coisas.
Abuso? Todas as coisas.
Racismo? Todas as coisas.
Relacionamentos frustrados? Todas as coisas.
Coisas realmente más? Todas as coisas.
De acordo com Paulo, é isso que traz prazer a Deus. Isso é o que Deus anseia fazer no mundo. Isso é o que Deus está fazendo no mundo agora. Renovando as coisas. E quando tudo estiver pronto, olharemos para toda essa história, com pontos tão realmente tristes e maus, com todas essas fraturas, com todas essas lacunas, com todos esses furos no script, com tudo que não deveria ser mas é, sabendo que Deus não foi o causador de nada disso. Mas que Ele está não apenas apto, mas louco de desejo de fazer todas, todas, todas, todas as coisas novas e lindas novamente em Cristo.  
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domingo, 27 de setembro de 2015

Deus não está ofendido


Essa mulher tem uma relação de dependência com a sua plantação. Ela planta aquela semente, com a esperança de que ela cresça e dê muito fruto, pois ela depende da comida que essa planta produz para sobreviver. Ela e o seu marido. E, então, ela começa a escutar as histórias dele também. De como ele depende da caça. De como, muitas vezes, ele passa dias fora de casa, caçando ou tentando. Às vezes, ele consegue a sua caça, e volta feliz. Mas, outras vezes, ele passa dias à fio em busca dela, e não consegue capturá-la.
Que curioso! Parece que essa relação de dependência que ela tem para com sua plantação também se dá de uma forma que parece um pouco aleatória. Existe essa grande bola de fogo nos céus, e essa planta precisa ser exposta a essa bola de fogo. Mas nem tanto, nem tão pouco, para que ela não morra. E a água que cai do céu? Precisa regar a plantação, para que ela continue frutificando. Mas nem tanto, para que ela não seja levada violentamente. Então, nasce uma criança. Essa nova vida em seus braços que depende dela. Mas quando ela vai ter a segunda, ela se dá conta de que está segurando uma criança sem vida.
Mas, por que isso? Existe essa força maior e todos parecem estar sujeitos a ela. A força que controla a bola do fogo, os animais, a água, a vida. O que fazer para que essas forças fiquem ao nosso favor? Já sei! Vamos nomeá-las, serão os nossos deuses. E sabe o que faremos? De tudo que produzirmos, daremos parte a eles, como uma oferta de paz, para que eles fiquem do nosso lado e não nos deixe perecer. Ofereceremos sacrifícios aos deuses. Os adoraremos e eles saberão que estamos agradecidos. Nesse ano colhemos 3 vezes mais que o ano passado, precisamos sacrificar mais. Já fazem 6 meses que não chove? Claramente, o deus que manda a chuva está ofendido conosco, precisamos oferecer mais, sacrificar mais. De alguma forma, esses deuses estão muito irados conosco.
Em certas civilizações, quando nada mais restava para se oferecer, eles cortavam o próprio corpo, para que através daquele sangue, aquele deus visse o quão gratos eles estavam e o quanto dependiam do seu favor. As plantações, os animais acabaram? Já me autoflagelei o suficiente? Oferecerei o meu primogênito como sacrifício. Você nunca saberá como satisfazer esses deuses, nunca saberá como lidar com eles.
Mas, espere aí. Em uma certa tribo, tudo começa diferente. Começa com um homem chamado Abrão, nascido em uma civilização suméria. E esse Deus estranho diz a Abrão que ele saia da casa dos seus pais, e O siga. Não, espere. Que absurdo! Esse Deus se comunicou, falou? Revelou sua vontade? Isso nunca aconteceu antes! E... por que Ele quer que ele abandone a casa dos seus pais? Bom, o pai de Abrão supostamente o ensinou a como agradar essas forças, ensinou que quando ele estiver passando por uma certa enfermidade, ele deve oferecer sacrifício àquele deus em específico, e quando a terra estiver estéril, Abrão deveria oferecer sacrifício àquele outro deus em específico. Esse Deus diz a Abrão que ele saia daquele ciclo, e o convida para algo totalmente novo. Então, pela primeira vez, Deus intervêm na história da humanidade. Esse Deus estranho, esse Deus que se comunica com a criação. Agora, isso é revolucionário. Ninguém jamais havia proposto isso.
Abrão sai da sua terra, e esse Deus o manda olhar para as estrelas dos céus, para demonstrar o quão numerosa será a sua descendência. Mas, veja, na civilização suméria, de onde Abrão saiu, as pessoas na verdade adoravam as estrelas, adoravam os astros. Eram deuses. Mas esse Deus usa outros deuses como simples acessórios para demonstrar o seu expansivo plano.
Abraão tem um filho. E Deus o pede em sacrifício, o filho que ele amava. A palavra amor aparece pela primeira vez em toda bíblia. Mas essa voz vem do céu e diz: “Não faça isso!!” E esse Deus dá um cordeiro em troca para sacrificar. Veja como a religião é retrógrada! Alguém chamaria os direitos humanos. Você não entende o quanto essa história é revolucionária. Abraão não está chocado, ele pergunta como sacrificar o filho e não por que. Esse Deus está dizendo a Abraão: “Você está acostumado com deuses ofendidos que pedem o que você tem de mais valioso em troca de favores. PARE!!”
Essa história deveria terminar com Abraão tentando agradar a Deus por meio de um holocausto, dando o seu próprio filho. Mas, em vez disso, acaba com um Deus que provêm. Não é sobre o que Abraão faz para Deus, mas é sobre o que Deus faz para Abraão.
Milênios se passam e o sistema está corrompido de novo. Saduceus e fariseus usando de violência para impor a suposta vontade de Deus através do medo. Esse curioso rabino surge, Jesus Cristo. Renovando as coisas mais uma vez. Revolucionando as coisas mais uma vez. Talvez, para você, um sermão revolucionário seja baseado em 5 pontos que começam com a mesma letra. Mas nessa cultura, essa voz clama “Misericórdia quero e não sacrifícios! ”, dando vida às palavras de um profeta chamado Oséias, e isso era absolutamente revolucionário. Ele olha para o templo que demorou 46 anos para ser reconstruído e diz “Destruam, e eu o reconstruirei em 3 dias”. Mas ele não estava falando daquele templo, e sim de si mesmo. Me matem, e eu me reconstruirei. Esse homem então é levado à cruz, para uma morte sórdida. E não há sequer uma violência em seus atos. A resistência de Jesus sem violência em um sistema baseado em violência questiona a natureza do altar. Será que o seu deus é tão mal-humorado assim?
Esse Deus chegou ao ápice do absurdo e do ridículo. Talvez você não entenda o que é amor. Mas eu vou te dizer que ele é a exata medida de um Deus que se flagelou para mostrar a sua criação o quanto Ele queria que ela parasse de se flagelar. Não é assim que se ganha favor. Veja as minhas marcas, que o sacrifício seja eu!
Mas, veja. Os primeiros cristãos entenderam tudo isso que eu estou escrevendo agora. O autor de Hebreus diz que é impossível que o sangue de touros e bodes remova pecados. Dia após dia, ano após ano, sacrifício após sacrifício. Mais sangue, mais holocaustos. E ele diz que não é como se aquilo fizesse paz com Deus, não é como se aquilo gerasse algum efeito positivo, aqueles sacrifícios eram apenas uma forma de aliviar a consciência humana. Vemos isso em várias partes da bíblia, inclusive no Antigo Testamento. Em Salmos 50, Deus diz que o mundo é dele, e tudo que nele existe, todos os animais da Terra e tudo que é potencialmente um sacrifício. E então, no verso 12, Ele te choca com o seguinte raciocínio: “Se eu tivesse fome, precisaria dizer a você? Tudo é meu! ”
Se você está barganhando com Deus para te dar algo, você está barganhando com o Deus errado.
Se o seu coração palpita, se os seus olhos estão abertos para o sofrimento do mundo moderno, você terá que se perguntar ocasionalmente: Será que vivemos em uma cultura tão retrógrada como as de antes? Será que temos os mesmos deuses raivosos e exigentes, e só o chamamos de nomes diferentes? Porque não se engane, se você diz que não acredita em Deus, isso é já um tipo particular de deus. Vivemos na cultura mais iluminada e progressista da história ou será que somos igualmente retrógrados e primitivos?  
Veja só, será que você vai para a igreja no domingo para passar os outros 6 dias aliviado da culpa? Para deixar Deus satisfeito? Será que você está tentando fazer trocas de favores ainda que inconscientemente? Será que você está tão cheio de culpa que não pode sequer ver beleza na vida? Será que você está correndo, trabalhando feito louco, sem tempo nem para respirar? Bom, esses são os mesmos velhos deuses com nomes diferentes.
Se há algum ritual verdadeiramente puro e bíblico é aquele em que celebramos a paz que temos com Deus através de Jesus Cristo, o qual se ofereceu como sacrifício máximo e se revelou na consumação do tempo exato. E se há um sacrifício válido, como disse Paulo, é o vivo. Porque, veja, o seu sacrifício tentando fazer paz com Deus e com o mundo é morto e inválido. Sacrifício normalmente fala de morte! E Paulo está sendo subversivo aqui. Como assim sacrifício vivo? O que quer dizer esse sacrifício vivo? Ele não é uma troca, nem uma forma de conseguir favor de Deus, porque isso você já tem! Não é uma barganha, nem mesmo uma forma de ser perdoado. O sacrifício vivo é quando você dá a Deus louvor e glória por não ter que fazer trocas, por não ter que alcançar o Seu favor, por não ter que barganhar com Ele, nem precisar de justificativas próprias para ser perdoado. Louvor e glória ao Deus com o qual fomos reconciliados, estamos em paz! Sacrifícios vivos e não mortos ao Deus que intervêm na história da humanidade para nos ensinar o caminho da paz, o qual não foi traçado por nós mesmos, mas por aquele que se ofereceu como sacrifício máximo.
Eu te desafio a fazer como eu fiz. Quando, cheia de culpa e condenação, eu me achegava a Deus para contar todos os meus erros, resolvi fazer um acordo. Eu disse que da próxima vez que eu viesse até Ele, iria perguntar quais pecados eu tinha confessado da última vez. Assim o fiz. E imediatamente algo pulou em meu coração dizendo “Eu não me lembro”.
Que você possa viver inserido na natureza desse Deus de amor, desse Deus que não está ofendido e nem com raiva. Mas está sempre apto a nos limpar e nos fazer novos todos os dias.
Graça e paz!
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